Assembléia Plenária

O Papa: todos os ministérios são formas de serviço aos outros

Após a saudação do Card. Farrell, o discurso do Santo Padre aos participantes da 2ª Assembléia Plenária do Dicastério
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"Sois um Dicastério “popular”, diria, e isto é lindo! Recomendo-vos: nunca percais este caráter de proximidade às mulheres e aos homens do nosso tempo".  Assim começou o Papa Francisco ao receber em audiência os participantes da II Assembléia Plenária do Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, que concluiu os trabalhos de dois dias sobre o tema: Os leigos e a ministerialidade na Igreja sinodal.

Após a saudação do Cardeal Kevin Farrell, Prefeito, o Papa se dirigiu aos numerosos membros e consultores presentes, aos funcionários do Dicastério e às suas famílias: "Agradeço-vos pelo trabalho realizado ao longo destes anos e pelo esforço com que trabalhais em todas as áreas da vossa competência. Elas dizem respeito à vida diária de muitas pessoas: famílias, jovens, idosos, grupos associados de fiéis e, mais em geral, leigos que vivem no mundo com as suas alegrias e dificuldades".

Publicamos abaixo a íntegra do discurso.

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Queridos irmãos e irmãs!

Dou as boas-vindas a todos vós, que participais nesta segunda Assembleia Plenária do Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida,  e agradeço ao Cardeal Farrell as suas amáveis palavras.

Agradeço-vos pelo trabalho realizado ao longo destes anos e pelo esforço com que trabalhais em todas as áreas da vossa competência. Elas dizem respeito à vida diária de muitas pessoas: famílias, jovens, idosos, grupos associados de fiéis e, mais em geral, leigos que vivem no mundo com as suas alegrias e dificuldades. Sois um Dicastério “popular”, diria, e isto é lindo! Recomendo-vos: nunca percais este caráter de proximidade às mulheres e aos homens do nosso tempo. Proximidade , sublinho isto.

Nos últimos dias, reunistes-vos para refletir sobre o tema: Os leigos e a ministerialidade na Igreja sinodal .

Quando se fala de ministérios , pensa-se em geral imediatamente nos ministérios “instituídos” — leitor, acólito, catequista — que são bem conhecidos e sobre os quais já se refletiu muito. Estes ministérios caraterizam-se por uma intervenção pública da Igreja — um ato específico de instituição — e por uma certa visibilidade. Eles estão ligados ao ministério ordenado, pois comportam várias formas de participação na tarefa que lhe é própria, embora não exijam o sacramento da Ordem.

No entanto, os ministérios instituídos não esgotam a ministerialidade da Igreja, que é mais ampla e que desde as primeiras comunidades cristãs diz respeito a todos os fiéis (cf. Carta Apostólica m.p. Antiquum ministerium , 2). Infelizmente, reflete-se pouco sobre ela, mas vós, oportunamente, dedicastes-lhe a vossa Plenária .

Em primeiro lugar, podemos perguntar-nos: qual é a origem da ministerialidade na Igreja? Poderíamos identificar duas respostas fundamentais.

A primeira é: o Batismo . Com efeito, é nele que tem a sua raiz o sacerdócio comum  de todos os fiéis, que por sua vez se exprime nos ministérios. A ministerialidade laica não se fundamenta no sacramento da Ordem, mas no Batismo, dado que todos os batizados — leigos, celibatários, casados, sacerdotes, religiosos — são christifideles , crentes em Cristo, seus discípulos, e portanto são chamados a participar na missão que Ele confia à Igreja, também através da assunção de determinados ministérios.

A segunda resposta é: os dons do Espírito Santo . A ministerialidade dos fiéis, e dos leigos em particular, nasce dos carismas que o Espírito Santo distribui no seio do Povo de Deus para a sua edificação (cf. ibid .): primeiro aparece um carisma, suscitado pelo Espírito; depois, a Igreja reconhece este carisma como serviço útil para a comunidade; no final, num terceiro momento, introduz-se e propaga-se um ministério específico.

Então, é ainda mais claro por que a ministerialidade da Igreja não se pode reduzir apenas aos ministérios instituídos, mas abrange um campo muito mais vasto. De resto, ainda hoje, como nas comunidades das origens, diante das particulares necessidades pastorais, sem recorrer à instituição dos ministérios, os pastores podem confiar aos leigos determinadas funções de suplência, ou seja, de serviços temporários, como acontece por exemplo no caso da proclamação da Palavra ou da distribuição da Eucaristia.

Para além dos ministérios instituídos, dos serviços de suplência e de outros cargos confiados de maneira estável, os leigos podem desempenhar uma multiplicidade de tarefas, que exprimem a sua participação na função sacerdotal, profética e real de Cristo, não somente no seio da Igreja, mas também nos ambientes nos quais estão inseridos. Alguns são de suplência, mas há outros que derivam da originalidade batismal dos leigos.

Penso sobretudo nas exigências ligadas às antigas e novas formas de pobreza, assim como aos migrantes, que exigem urgentemente ações de acolhimento e de solidariedade. Nestes âmbitos de caridade podem surgir muitos serviços que se configuram como verdadeiros ministérios. Trata-se de um grande espaço de compromisso para quem deseja viver concretamente, em relação aos outros, a proximidade de Jesus, que muitas vezes experimentou pessoalmente. Assim o ministério torna-se, além de um simples compromisso social, uma bonita experiência pessoal e um grande testemunho, um verdadeiro testemunho cristão.

Depois penso na família, sobre a qual sei que também refletistes juntos, durante esta Plenária, examinando alguns desafios da pastoral familiar, entre os quais as situações de crise matrimonial, os problemas dos separados e divorciados, e de quantos vivem numa nova união ou que recasaram. Na Christifideles laici  afirma-se que existem ministérios que têm o seu fundamento sacramental no Matrimónio, não apenas no Batismo e na Confirmação (cf. n. 23). Na Familiaris consortio  fala-se da missão educativa da família como de um ministério de evangelização, que faz dela um lugar de verdadeira iniciação cristã (cf. n. 39). E já na Evangelii nuntiandi  recorda-se que a missionariedade intrínseca à vocação conjugal se exprime também fora da própria família, quando ela se torna «evangelizadora de muitas outras famílias e do ambiente onde está inserida» (cf. n. 71). Detenho-me um minuto aqui, porque citei a Evangelii nuntiandi . Esta exortação de São Paulo vi  ainda está em vigor: está em vigor hoje, é atual! Por favor, retomai-a, relede-a, é de grande atualidade! Há muitas coisas, que quando as encontramos de novo, dizemos: “Ah, como era clarividente Montini!”. Vê-se ali aquela clarividência do grande santo que guiou a Igreja!

Estes que citei são alguns exemplos de ministérios laicais, aos quais se poderiam acrescentar muitos outros, reconhecidos de várias maneiras pelas autoridades eclesiais como expressões da ministerialidade da Igreja em sentido amplo.

Contudo, devemos lembrar algo: eles — ministérios, serviços, ofícios — nunca devem tornar-se autorreferenciais. Fico zangado quando vejo ministros leigos que — perdoai-me a expressão — se “incham” ao desempenhar este ministério. Isto é ministerial, mas não é cristão; são ministros pagãos, cheios de si próprios. Prestai atenção a isto: nunca devem tornar-se autorreferenciais! Quando o serviço é unidirecional, não é “de ida e volta”, não funciona.  O seu propósito transcende-os, e consiste em levar os «valores cristãos ao mundo social, político e económico» do nosso tempo (cf. Exortação Apostólica Evangelii gaudium , 102). Esta é a missão confiada sobretudo aos leigos, cujo agir não pode limitar-se «a tarefas intraeclesiais, sem um compromisso real na aplicação do Evangelho à transformação da sociedade» (ibid. ). Às vezes vemos leigos que se parecem com sacerdotes falhados. Por favor, resolvei este problema!

Portanto, olhando para os vários tipos de ministerialidade que enumeramos, é útil fazer-nos uma última pergunta: o que une?

Duas coisas: a missão e o serviço . Com efeito, todos os ministérios são expressão da única missão da Igreja e todos são formas de serviço ao próximo. Em particular, apraz-me salientar que na raiz do termo ministério  está a palavra minus , que significa “menor”. Jesus disse-o: que quem comanda se torne o mais pequenino, caso contrário não saberá comandar. Trata-se de um pequeno detalhe, mas de grande importância. Quem segue Jesus não tem medo de se fazer “inferior”, “menor”, e de se pôr ao serviço dos outros. Com efeito, foi o próprio Jesus que nos ensinou: «Quem quiser tornar-se grande entre vós seja o vosso servo, e quem quiser ser o primeiro, seja servo de todos» (Mc  10, 43-44). É aqui que reside a verdadeira motivação que deve animar cada crente a assumir qualquer tarefa eclesial, qualquer compromisso de testemunho cristão na realidade em que vive: a vontade de servir os irmãos e, neles, servir Cristo. Só assim cada batizado poderá descobrir o sentido da própria vida, experimentando com alegria que é «uma missão nesta terra» (ibid ., 273), ou seja, chamado de vários modos e formas a «iluminar, abençoar, vivificar, aliviar, curar, libertar» (ibid. ) e deixar-se acompanhar!

Amados irmãos e irmãs, agradeço-vos mais uma vez o trabalho que desempenhais ao serviço do santo Povo fiel de Deus. Que Nossa Senhora vos acompanhe e vos obtenha os dons do Espírito Santo! Abençoo-vos de coração e peço-vos, por favor, que rezeis por mim. Obrigado!

 

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22 de Abril de 2023